terça-feira, 7 de outubro de 2014

Um pouco de história - A formação em Psicologia II

O estudo de psicologia foi desafiante. Eu tinha que trabalhar para pagar a faculdade porque inicialmente a família tinha problemas em eu estudar em faculdade particular. Era pra eu fazer faculdade pública ou PUC. Nada mais era bom o suficiente. Claro que todos mudaram de ideia depois de um tempo e nos ajudamos, mas foi uma conquista.

Para pagar o último semestre que fiz de cursinho eu já tinha conseguido um emprego como secretária. Indicação da minha querida Elisa. Mas ficava absolutamente impossível morar na Água Branca, trabalhar no Itaim e estudar no Ipiranga. Arrumei outro, fui dar aulas numa fábrica de molas para caminhões na divisa com São Bernardo.

O horário era bom, o salário também. A experiência nem se fala. Riquíssima. A começar pelo fato de meu aluno mais novo ter pelo menos 5 anos a mais que eu. E terminando por um deles se matriculando no ensino médio e me agradecendo por não ir lá só pra me exibir, mas para ensinar. Orgulho do meu trabalho.

E assim eu terminava as aulas as 17hs, ia pra faculdade e tinha tempo até as 19hs para estudar e participar de atividades sociais. Fui secretária do DCE, depois da Associação de Antigos Alunos e último-Anistas. Organizava as paradas. Nada de corrupção. Bolsas para estudantes carentes, trotes solidários, visitas à favelas. Tudo isso eu pude fazer e ainda curtir um pagodinho vez em quando.

Queria participar de pesquisas na época, mas a São Marcos engatinhava nessa área. Tinha um único grupo, com lista de espera. Se tornavam Universidade mas bem incipiente naquele momento. Mas tinha uma excelente clínica e foi com isso que me envolvi.

Sempre gostei de atender e nunca fui muito psicanalítica no sentido das regras, da abstenção, da tela em branco. Me permitia interagir com os pacientes e perceber as consequências disso. Tinha uma grande parceira, Mirela. Uma gama de professores e uma supervisora que não esqueço, a Aspázia. Lembro em uma supervisão que fiquei o tempo todo vendo um pássaro lá fora da sala, mas com os ouvidos atentos aos casos discutidos. Uma coleguinha muito despreparada tomava uns chuás toda supervisão. Ela queria “fazer faculdade de oftalmologia, mas não encontrou no guia e foi tentar a psicologia”. E os professores a passaram de semestre, empurraram sempre. Até o último ano quando as supervisoras perceberam a barbaridade. Nenhuma maturidade, tampouco conhecimento. Ela era limitada mesmo, tinha muitas dificuldades, mas com um orgulho inabalável não aceitava ajuda e ficou pelo caminho.

Eu atendia em dupla com a Mirela, dois meninos, casos diferentes, claro. Um com dificuldades de aprendizagem e outro com encoprese e enurese (fazia xixi e cocô nas roupas). Bom, esses eram os encaminhamentos, mas sabe o que? Estes dois lindos me ensinaram muito e nunca apresentaram qualquer dos sintomas relatados durante as sessões.


Claro, tratamos as famílias deles. Eu entendo assim. A criança chega como sintoma da família. As questões de vínculo, papéis, atitudes, transparecem nas crianças porque elas são mais abertas, menos neuróticas que os adultos que já construíram todo um sistema de defesas. E na abordagem da terapia infantil, acabo trabalhando de maneira familiar e sistêmica. E tudo pode acontecer, inclusive nada. Nada?

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